sexta-feira, 3 de abril de 2020

RETENDO O QUE É BOM

Retende o que é bom
Tratado escrito por
J. C. Ryle
Clérigo e Bispo na Igreja da Inglaterra
Leitor,
Há poucas coisas na religião as quais os homens estão tão prontos
para esquecer quanto o dever de “lutar seriamente pela fé” e reter o
que é verdade.
Controvérsia raramente é popular. Muitos preferem uma vida religiosa
sossegada. Homens não gostam de qualquer coisa semelhante a conflitos,
problemas, lutas e esforço. Eles darão muitos de seus pretextos
enganadores para assegurar a paz. Eles são aptos a esquecer que paz
a custa da verdade, não é digna. Em resumo, eles precisam se lembrar



das palavras de ouro de Paulo: “retende o que é bom.” (1 Tess 5:21).
Leitor, quando Paulo disse, “retende”, ele escreveu como alguém que
sabia como o coração de todo cristão é. Ele sabia que nossa compreensão
do Evangelho, no seu melhor, é muito fria, que nosso amor logo
“se debilita”, que nossa fé rapidamente oscila, que nosso zelo logo enfraquece,
que a familiaridade, o costume, com a Verdade de Cristo
muitas vezes traz desobediência, que, assim como Israel, somos aptos
a desistir por causa da longa jornada, e como Pedro estamos prontos a
dormir em um momento e lutar no outro, mas assim também como
Pedro, não estamos prontos para “vigiar e orar”. Em tudo isso Paulo
lembra, e como um vigia fiel, ele clama através do Santo Espírito, “retende
o que é bom”.
Ele escreveu como se previsse pelo Espírito que os ensinamentos do
Evangelho logo poderiam ser corrompidos, estragados e arrancados
para longe da Igreja. Ele escreveu como quem previa que Satanás e
todos seus agentes poderiam trabalhar duro para abater a Verdade de
Cristo. Ele escreveu como se pudesse advertir os homens desse perigo,
e ele clama, “retende o que é bom”.
Leitor, o conselho sempre é necessário – necessidade tão antiga quanto
à fundação do mundo. Existe uma tendência à queda na melhor
das instituições humanas. A melhor Igreja visível de Cristo não está
livre de sua tendência a degeneração. Ela é feita de homens falíveis.
Há sempre nela uma tendência a queda. Nós observamos um fermento
maligno rastejando dentro da Igreja, mesmo nos tempos do Apóstolo.
Havia mal na Igreja de Corinto, na Igreja de Éfeso e na Igreja da Galácia.
Todas essas coisas se destinaram para nos avisar e nos guiar nes4
ses últimos tempos. Tudo mostra a grande necessidade que está sobre
a Igreja para se lembrar das palavras do Apóstolo: “retende o bom”.
Muitas Igrejas de Cristo desde então tem caído e estado longe de quererem
se lembrar desse princípio. Seus ministros e membros se esqueceram
que Satanás está sempre trabalhando para nos conduzir na
falsa doutrina. Eles esquecem que Satanás pode se transfigurar em
anjo de luz, que pode fazer as trevas parecer luz, e luz parecerem trevas;
a verdade parecer mentira, e falsificar a verdade. Se ele não pode
destruir o Cristianismo, ele sempre tentará estragá-lo. Se não pode
evitar a piedade, ele se esforça para roubar o poder das Igrejas. Nenhuma
Igreja estará segura se esquecer essas coisas e não manter na
mente a ordem do Apóstolo, “retende o que é bom”.
Leitor, se alguma vez houve um tempo no mundo em que as Igrejas
estavam trilhando seu caminho, em que poderiam reter a verdade ou
não, esse é tempo agora, essas Igrejas são as Igrejas protestantes de
nossa própria terra.
O Papismo, aquele velho inimigo da nossa nação, está vindo para nós
nesses dias como um dilúvio. Nós somos assaltados por inimigos declarados
de fora, e traídos continuamente por amigos falsos de dentro.
Igrejas Católicas Romanas, capelas, escolas, conventos e monastérios
estão constantemente crescendo ao nosso redor. Mês após mês nos
chegam noticias de alguma nova apostasia e deserção das fileiras da
Igreja da Inglaterra para as classes da Igreja de Roma. O Papa já divide
nosso país em dioceses e fala como quem imagina que por ele dividirão
os despojos. Ele já parece prever um tempo quando a Inglaterra
será o patrimônio de São Pedro, quando Londres será como Roma,
quando São Paulo será como São Pedro, e quando o Palácio de Lambeth
será como Vaticano é. Sem dúvida, agora ou nunca, nós deveríamos
acordar, e “reter o que é bom”.
Alguns de nós em sua cegueira achávamos que o poder da Igreja de
Roma estava acabado. Alguns de nós sonhamos em nossa tolice, que a
Reforma tinha acabado com a controvérsia Papal, e que se o Romanismo
sobrevivesse, estaria também mudado. Se assim pensávamos,
temos vivido para aprender que cometemos um dos mais graves erros.
Roma nunca muda. É sua vanglória ser sempre a mesma. A serpente
não está morta. Ela foi golpeada no tempo da Reforma, mas não foi
destruída. O Anticristo Romano não morreu. Ele foi abatido por uma
pequena temporada, como a fábula do gigante preso sobre o Etna,
mas sua ferida mortal está curada, o sepulcro está aberto mais uma
vez, e o Anticristo esta vindo adiante. O espírito impuro do Papismo
não está posto em seu lugar. Antes, ele parece dizer, “Minha casa na
Inglaterra está varrida e enfeitada para mim; deixe-me retornar para o
lugar de onde vim”.
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E leitor, a questão agora é se vamos tolerar isso, calmamente, sentados,
de braços cruzados e não vamos fazer nada para resistir esse
roubo. Nós realmente somos os homens de discernimento desses tempos?
Conhecemos o dia de nossa visitação? Certamente essa é uma
crise na história de nossas Igrejas e de nosso país. Esse é o tempo que
em breve provará se conhecemos o valor de nossos privilégios, ou se,
como Amaleque, “a primeira das nações”, nosso fim será perecer para
sempre. É o tempo ao qual provará se permitiremos que nosso castiçal
seja silenciosamente removido, ou nos arrependeremos e faremos nossas
primeiras obras. Se nós amamos a Bíblia aberta, se amamos pregação
do Evangelho, se amamos a liberdade de ler essa Bíblia, nenhum
homem nos impedirá ou nos travará, e a oportunidade de ouvir
esse Evangelho, nenhum homem proibirá, se nós amamos a liberdade
civil, se amamos a liberdade religiosa, se essas coisas são preciosas
para nossas almas, devemos obrigar nossas mentes a “reter”, para que
não percamos tudo pouco a pouco.
Leitor, se queremos dizer “retende”, cada paróquia, cada congregação,
cada homem Cristão, cada mulher Cristã deve fazer a sua parte na
luta pela verdade. Cada um deve trabalhar, cada um deve orar, cada
um deve trabalhar duro como se a preservação do puro Evangelho dependesse
de si mesmo, de ninguém mais. Os bispos não devem deixar
esse assunto para os presbíteros, nem os sacerdotes para os bispos. O
clero não deve deixar o assunto para o leigo, nem o leigo para o clero.
O Parlamento não deve deixar o assunto para o estado, nem o estado
para o Parlamento. O rico não deve deixar o assunto para o pobre,
nem o pobre para o rico. Nós todos devemos trabalhar. Cada alma vivente
tem uma esfera de influência. Deixe-a ver para que a preencha
seu lugar. Cada alma vivente pode obter algum peso na balança do
Evangelho. Deixe-a ver para que ela se lance. Deixe todos enxergarem
sua responsabilidade individual nesse assunto, e todos, pela ajuda de
Deus, ficarão bem.
Se desejarmos reter o que é bom, não devemos tolerar ou consentir com
qualquer doutrina que não seja a pura doutrina do Evangelho de Cristo.
Há um ódio que é pura caridade: é o ódio das doutrinas errôneas. Há
uma intolerância que é puramente louvável: que é a intolerância do
falso ensinamento no púlpito. Quem já pensou em tolerar um pouco
de veneno ministrado dia a dia? Se homens vierem entre vós e não
pregar “todo o conselho de Deus”, não pregar sobre Cristo, pecado e
santidade, sobre a ruína, redenção e regeneração, ou não pregar essas
coisas de uma maneira Bíblica, vocês devem parar de ouvi-lo. Você deve
agir mediante a prescrição dada pelo Espírito Santo no Velho Testamento:
Filho meu, deixe de ouvir as palavras de uma instrução que
levam ao erro das palavras do conhecimento (Pv 19:27; ou: Se deixa de
ouvir as palavras da instrução, desviar-te-ás das palavras do conhecimento).
Você deve cumprir aquilo que o Espírito mostrou através do
Apostolo Paulo em Gálatas 1:8 – “Mas, ainda que nós ou mesmo um
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anjo do céu vos pregue evangelho que vá além do que temos pregado,
seja anátema”. Logo, se podemos suportar ouvir a verdade de Cristo
mutilada ou adulterada, se não conseguimos enxergar dano em ouvir
esse outro Evangelho, se podemos nos sentar tranquilamente enquanto
um Cristianismo fraudulento é derramado em nossos ouvidos, e
podemos depois ir para casa confortavelmente e não queimar de santa
indignação, se esse é o caso, há pouca chance de se fazer muito para
resistir a Roma. E se estamos contentes em ouvir Jesus Cristo não
sendo colocado em seu Justo lugar, não somos homens e mulheres
aptos para fazer o serviço de Cristo, ou lutar uma boa luta ao Seu lado.
Aquele que não é zeloso contra o erro, provavelmente não será zeloso
com a verdade.
Se nós queremos reter a verdade, devemos estar prontos para nos unir
com todos os que retêm a verdade, e amar o Senhor Jesus Cristo em
sinceridade. Devemos estar prontos para deixar de lado todas as questões
menores como coisas de importância subordinada. Instituição ou
não, liturgia ou sem liturgia, batina ou sem batina, bispos ou presbíteros,
todos esses pontos de diferença, embora sejam importantes, podem
ser colocados em seu lugar e em sua proporção e todos devem ser
considerados questões subordinadas. Não peço a nenhum homem suas
opiniões pessoais sobre eles. Não desejo que nenhum homem viole
sua consciência. Tudo que eu digo é que essas questões são madeira,
feno e palha, quando os verdadeiros fundamentos da fé estão em perigo.
Os Filisteus estão sobre nós. Podemos chegar a uma causa comum
contra eles, ou não? Esse é o ponto da nossa consideração. Certamente
não é correto dizer que esperamos passar a eternidade no céu com
homens e não podemos trabalhar poucos anos com eles nesse mundo.
É tolice falar em aliança e união se, em dias como esses, na existe cooperação.
A presença de um inimigo comum deve afogar as nossas
diferenças menores. Devemos nos manter unidos: todos os Protestantes
devem estar juntos, se eles quiserem “reter o que é bom”.
Em último lugar, se é certo “reter o que é bom”, vamos nos assegurar
que temos agarrado pessoalmente a verdade de Cristo para nós mesmos.
Leitor, tudo isso não nos salvará do conhecimento de todas as
controvérsias e não nos habilitará para detectar tudo que é falso. Conhecimento
nunca levará você ou eu para o céu. Isso não nos guardará
para estarmos aptos a discutir e argumentar com Católicos Romanos,
ou para detectar os erros das bulas Papais, ou cartas pastorais.
Isso nos permitirá enxergar que cada um de nós se apegou a verdade
de Cristo pela nossa fé pessoal. Veremos que cada um de nós fugiu
para o refúgio e nos agarramos à esperança que é colocada diante de
nós em Seu Evangelho glorioso. Façamos isso e estaremos bem com
nós mesmos, mesmo se todo resto for mal. Vamos fazer isso e então
todas as coisas serão nossas. A Igreja pode falhar. O Estado pode falir.
As fundações de todas as instituições podem ser abaladas. Os inimigos
da verdade podem por alguma razão prevalecer; mas para nós tu7
do estará bem. Teremos paz nesse mundo e no mundo porvir, vida
eterna, para nós que teremos Cristo.
Leitor, se você ainda não se agarrou nessa esperança em Cristo, busque-
a imediatamente. Peça ao Senhor para dá-la a você. Não dê descanso
a Ele até que você saiba e sinta que você está Nele.
Se você tem se agarrado a essa esperança, “retenha”. Tenha-a em alta
estima, para que ela esteja do seu lado quando todo resto falhar.


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E sobre eles três presidentes, dos quais Daniel era um, aos quais estes príncipes dessem conta, para que o rei não sofresse dano. Daniel ...